Buracos Negros Podem Brilhar?

Kai Arashi

9/27/20253 min read

Quando pensamos em buracos negros, automaticamente imaginamos objetos que sugam tudo ao seu redor, e que uma vez dentro deles, nada consegue escapar – nem mesmo a luz, que é a coisa mais rápida do universo. Por isso, sabemos que buracos negros não emitem luz. Diferente das estrelas, que produzem fótons em seu interior que escapam para o espaço, os buracos negros parecem eternamente escuros.

No entanto, isso não significa que eles não possam “brilhar”. Essa ideia pode parecer paradoxal: como um objeto que não emite luz poderia, de alguma forma, brilhar? A resposta está na radiação Hawking, descoberta pelo físico Stephen Hawking na década de 1970. Essa radiação mostra que buracos negros podem, sim, emitir energia de forma gradual, e esse efeito tem implicações profundas não apenas para os buracos negros, mas também para o destino do próprio universo.

Antes de entender a radiação Hawking, é importante ajustar a forma como pensamos sobre buracos negros. Eles não são objetos como estrelas, planetas ou estrelas de nêutrons, que são formados por matéria em diferentes estados, como sólido, líquido, gasoso ou plasma. Um buraco negro é, na verdade, uma região do espaço-tempo com curvatura extrema, delimitada pelo chamado horizonte de eventos – a fronteira a partir da qual nada consegue voltar. Para um observador externo, isso se traduz em uma esfera escura que não emite luz.

Stephen Hawking trabalhou justamente nessa fronteira do conhecimento, tentando unir duas áreas fundamentais da física: a relatividade geral, que descreve a gravidade e o universo em grandes escalas, e a mecânica quântica, que descreve as interações microscópicas, como eletromagnetismo e forças nucleares. Até então, essas duas teorias não “conversavam” entre si, e o fenômeno das singularidades – seja no centro dos buracos negros ou no Big Bang – exigia uma abordagem que unisse o macro e o micro.

Enquanto estudava os efeitos quânticos na região do horizonte de eventos, Hawking descobriu algo surpreendente: buracos negros não apenas podiam diminuir de tamanho – fenômeno chamado evaporação de buraco negro –, como também poderiam emitir radiação, ou seja, brilhar de certa forma. Esse efeito, inicialmente controverso, se tornou um dos maiores avanços da física teórica.

Mas como funciona essa radiação? Para entender, é preciso lembrar que o “vácuo” quântico não é vazio: ele está cheio de campos quânticos que descrevem energia e momento para cada partícula. Pelo princípio da incerteza de Heisenberg, a energia pode oscilar, gerando pares de partículas virtuais que aparecem e desaparecem rapidamente. Normalmente, essas partículas se aniquilam mutuamente, mas se isso ocorre próximo ao horizonte de eventos de um buraco negro, uma partícula pode escapar enquanto a outra permanece presa. A energia da partícula que escapa é retirada do próprio buraco negro, fazendo com que ele perca massa.

Esse fenômeno tem duas consequências importantes. Primeiro, do ponto de vista de um observador externo, o buraco negro parece emitir radiação, ou “brilhar”. Segundo, devido à equivalência entre massa e energia, a emissão contínua faz com que o buraco negro enxugue sua massa lentamente, até evaporar por completo.

No entanto, os buracos negros que observamos hoje não estão morrendo de fato. A maioria deles ainda se alimenta de matéria ao seu redor – seja de gases, estrelas ou mesmo do centro da Via Láctea – e o processo de alimentação é mais rápido do que a perda de massa causada pela radiação Hawking. Para buracos negros supermassivos, a radiação é praticamente imperceptível. Apenas os buracos negros primordiais, hipotéticos e muito pequenos, poderiam evaporar rapidamente, emitindo grandes quantidades de radiação no final de sua vida.

O fenômeno ainda não foi observado diretamente, porque o brilho é extremamente fraco e ofuscado por discos de acreção e outras fontes luminosas. No entanto, experimentos em laboratório, como aqueles envolvendo o efeito Casimir ou o condensado de Bose-Einstein, já reproduziram efeitos análogos e confirmaram que a teoria é consistente. Pesquisadores também buscam sinais de buracos negros primordiais em explosões de raios gama, utilizando telescópios como o HESS.

A radiação Hawking é uma das poucas peças que permite estudar a interação entre mecânica quântica e relatividade geral, oferecendo pistas para a unificação da física. Ela não resolve todas as questões sobre singularidades, mas é um passo fundamental para entender fenômenos que nem Einstein conseguiu explicar. Hoje, com tecnologia que não existia no século passado, podemos não apenas observar buracos negros em fotos, mas também, talvez, estar perto de confirmar esse efeito teórico. Quem sabe, estamos na primeira geração capaz de testemunhar evidências da radiação Hawking e avançar rumo à unificação da física.